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CONTOS II - Ciranda, Cirandinha... (final)
CIRANDA, CIRANDINHA... (final)

Rua dos Ingazeiros, 39.
Fabrício chega ao endereço que tinha pego com um conhecido, no bar.
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APRESENTAÇÃO
POEMAS
POEMAS I - Arco-Íris - A Roseira - Dia de Festa - Vida de Poeta - Despedida - Tempo de Estima - Grampo de Cabelo - Duas Faces
POEMAS II - Imagens no Espelho - Analogia - Jardim - Conhecendo uma Mulher - Céu Estrelado - Mar em Calmaria - Prazer Total - Quando a Noite Vier
POEMAS III - Vestido - Volta ao Começo - Declaração - Além da Morte - Idealização - Faz-de-Conta - Uma Gota no Oceano - O Desejo de Ser...
POEMAS IV - A Cigana - Um Novo Dia - Em um Minuto - Cinderela - O Pintor de Quadros - Doçura - Divisão - Menina da Noite
POEMAS V - O Pequeno Pássaro
PROSA
CONTOS I - Cedo Demais
CONTOS I - Cedo Demais (final)
CONTOS II - Ciranda, Cirandinha...
CONTOS II - Ciranda, Cirandinha...(final)
ARTIGOS E CRÔNICAS - Um Ato de Amor - Na Terra do Peter Pan Só Não é Criança Quem Não Quer / Os Sem-Praia - Plante uma Flor no Coração
PROJETOS
DRAMATURGIA - As Gêmeas/ Drama - O Reino de Cristal/ Infantil - Atribulações em Família/ Comédia de Costumes
CINEMA - Fogo Sob as Cinzas/ Drama/ Longa Metragem - Clube dos Espertos/ Comédia/ Curta
TV/ VIDEO - No Mundo Encantado/ Série p/ o Público Jovem
INFORMAÇÕES
MÚSICA - Vingança dos Carecas
GALERIA DE FOTOS
ENCERRAMENTO
O que acontece é que talvez o garoto permanecesse alí ainda por um tempo indefinido, se não ouvisse a voz do pai no outro cômodo. Não entendia direito o que dizia, em virtude do barulho, porém reconhecia que a voz era a dele. Foi, então, averiguar. Chegando à porta do quarto, viu Fabrício com a garrafa de champanhe na mão e dois corpos ensangüentados no local. Um homem no chão, deitado de bruços, e a mãe na cama. Ambos inconscientes, enquanto o pai bebia o champanhe sozinho, comemorando. Em seguida ele coloca a arma nos dedos inertes de Januário, coloca uma taça de champanhe no criado mudo, do lado de Rosalva e joga outra taça no chão, como se tivesse caído da mão dele. Coloca cuidadosamente a garrafa ao lado da taça dela. Via-se com clareza nos corpos, uma mancha de sangue na altura do peito dela e o sangue que escorreu do ouvido direito dele. Completando a cena, um indivíduo tão entretido que nem viu o filho se aproximando. Demonstra estar alegre, aliviado. Parte para a bebida e a comemoração, tomando mais um pouco do champanhe.
- Viva 1994! Viva o Ano Novo! - Levanta a garrafa, eufórico. Depois a coloca junto ao corpo do rival.
O garoto, assustado, correu ao encontro de Rosalva. Aos primeiros movimentos do filho, Fabrício é pego de surpresa. Falta-lhe uma reação imediata.
- Mamãe! - O menino grita e agarra-se à mãe - Mamãe!...
Fabrício volta ao normal. Chama a atenção do filho.
- Luiz Carlos! - tom de repreensão - Não disse para você ficar am casa?
O filho não entendia coisa alguma, a não ser o fato de ver a mãe morta. Foi aquilo que ficou na sua mente, além da reação do pai que o levava para fora da casa. Muitas pessoas na rua, na alegria da passagem do ano nem viam o Fabrício, que demonstrando estar feliz, dando vivas ao ano que começava, levava consigo o garoto.
Dias mais tarde um pai extremoso explica ao filho, escondendo sua culpa, o que logo saía na manchete do jornalzinho municipal e era espalhado de boca em boca no lugarejo.
" Primeira tragédia de 1994! Matou a amante e se suicidou em seguida!"
Numa conversa reservada falou-lhe daquele homicídio cometido pelo Januário: que após matar a Rosalva, se matou. Concluindo, pediu ao menino que mantivesse silêncio quanto à presença deles no local do crime. Ninguém deveria saber, afinal, para que? Não teve como evitar o acontecimento trágico, portanto teriam que se conformar e tentar esquecer aquela fatalidade.
Alguns anos se passam. Treze, para ser mais exato. Fabrício, no final da vida, em um leito, com o filho já adulto, confessa-lhe o crime que cometeu, com os requintes de todos os detalhes, desde quando tomou conhecimento de que estava sendo enganado. Realmente, tinha matado a mulher e seu amante e quis saber do rapaz, na época, ao morrer, se tinha entendido e aceitado o que tinha cometido, porque se sentiu aliviado de se livrar da vergonha, resolvida através do crime, embora um peso nos ombros tenha permanecido consigo por ter ocultado a verdade. Além disso, ficou observando se a morte da mãe tinha deixado alguma sequela em Luiz Carlos. Durante aqueles anos todos que conviveram após o crime, tentou desvendar as reações do filho, sem ter tido coragem de falar-lhe diretamente sobre o que havia acontecido, pois o pai nunca aceitou a ideia de ser desprezado pelo filho, se ele soubesse o que realmente ocorreu. No entanto, nessa circunstância atual, chegava a hora de retirar a barreira que os separavam da verdade. Ele precisava saber a reação do rapaz, porque estava muito doente, sentia que estava à beira da morte, portanto isso era o que mais queria ao final da vida. Saber o que o jovem pensaria ao tomar ciência da verdade. A resposta. Precisava da resposta.
- Espero que você tenha compreendido o que fiz. Na época, só pensei na vergonha de ser um marido enganado, nesta cidadezinha de tanta gente conservadora. Eu seria ridicularizado demais se tua mãe e seu amante continuassem vivos...
- Eu entendi, papai. Não imaginava que você a tivesse matado, mas compreendo seus motivos.
- Obrigado! Precisava ouvir isso. Foram muitos anos sem saber se um dia teria o seu entendimento ao confessar esse crime... Anos que mentí para você... A verdade finalmente foi revelada!... Posso morrer em paz!...
- Luiz Carlos!
Uma voz de mulher repete o chamado.
- Luiz Carlos, está me ouvindo? Há algum tempo está ausente, olhando para o mar...
- Ângela, desculpe. Estava tão absorvido em meus pensamentos...
Uma lágrima corre no rosto dele.
- O que é isso? Você está chorando?
- Não, não é nada!
- Toda virada de ano é a mesma coisa.
Fogos soam em números incontáveis e aumentam gradativamente a caminho de um climax que finalmente chega. Ele aproveita a ocasião e procura desconversar.
- Quantos fogos!
- É meia-noite, querido! Feliz Ano Novo! Feliz 2012, amor!
Ela o beija com ternura.
- Para você também! - Volta a se ausentar - É! A honra de um homem em poucos minutos foi lavada. Penso o quanto seria desesperador para o meu pai os comentários desta cidade pequena que não aceita a traição de uma mulher... Sem o trágico final que o aliviou do ridículo. Entendi o lado dele. Se a minha mãe continuasse viva... Penso muito nisso! Mas precisava ser assim? Fazer-me sofrer tanto, com essa dor que não passa? Vou morrer com isso! - Volta à realidade e se impacienta. - Vamos embora. Nada de ver essa alegria toda perto de mim, essas pessoas festejando... Não consigo encarar essa data como as outras pessoas fazem.
- Entendo!
Os dois, que estavam sentados na areia branca de uma bela praia, se levantam e vão andando, deixando de lado a festividade que os cerca, dessa comemoração pela chegada do dia que para os outros significa uma esperança de melhoria dali para adiante. Os demais estão alheios ao indivíduo presente na praia, obrigado a nesse momento, sagradamente, como em todos os anos, a seguir os passos percorridos naquele último dia de 1993, quando era um menino de oito anos, que ficou abalado para sempre.
O casal sai abraçado da praia e vai andando pelas calçadas sem um rumo certo. Em dada ocasião param para observar um grande grupo, que se encontra reunido. Adultos se abraçam, felizes. Crianças, na rua, brincam de roda.
- " Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar, vamos dar a meia-volta, volta e meia vamos dar..."
Luiz Carlos e Ângela voltam a andar. Seguem aos poucos. A cantoria das crianças, proporcionalmente, vai se tornando cada vez mais distante.
- " O anel que tu me destes era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou..."

Viva o Ano Novo! Mais um ano está começando! Mas para o Luiz Carlos as lembranças do passado voltam a ser uma tortura muito grande.