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CONTOS I - Cedo Demais (final)
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POEMAS I - Arco-Íris - A Roseira - Dia de Festa - Vida de Poeta - Despedida - Tempo de Estima - Grampo de Cabelo - Duas Faces
POEMAS II - Imagens no Espelho - Analogia - Jardim - Conhecendo uma Mulher - Céu Estrelado - Mar em Calmaria - Prazer Total - Quando a Noite Vier
POEMAS III - Vestido - Volta ao Começo - Declaração - Além da Morte - Idealização - Faz-de-Conta - Uma Gota no Oceano - O Desejo de Ser...
POEMAS IV - A Cigana - Um Novo Dia - Em um Minuto - Cinderela - O Pintor de Quadros - Doçura - Divisão - Menina da Noite
POEMAS V - O Pequeno Pássaro
PROSA
CONTOS I - Cedo Demais
CONTOS I - Cedo Demais (final)
CONTOS II - Ciranda, Cirandinha...
CONTOS II - Ciranda, Cirandinha...(final)
ARTIGOS E CRÔNICAS - Um Ato de Amor - Na Terra do Peter Pan Só Não é Criança Quem Não Quer / Os Sem-Praia - Plante uma Flor no Coração
PROJETOS
DRAMATURGIA - As Gêmeas/ Drama - O Reino de Cristal/ Infantil - Atribulações em Família/ Comédia de Costumes
CINEMA - Fogo Sob as Cinzas/ Drama/ Longa Metragem - Clube dos Espertos/ Comédia/ Curta
TV/ VIDEO - No Mundo Encantado/ Série p/ o Público Jovem
INFORMAÇÕES
MÚSICA - Vingança dos Carecas
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ENCERRAMENTO
À noite, logo que Oscar chega do trabalho, mal entra na sala, Elvira conta a ele tudo que aconteceu. Oscar revolta-se com a situação, esbravejando furiosamente.
- Pronto! Nossa filha se perdeu! Caiu na vida!
- O que vamos fazer? - Indaga Elvira, apreensiva.
- Você deixou acontecer... Agora me pergunta o que vamos fazer? Deixe-me sozinho. Tenho que pensar... Sai, sai, sai daqui!
Ele passa longos minutos na sala, pensativo. Fica calado, olhando o movimento da rua pela janela. De repente, encontra a solução. Reúne a mulher e a filha e conta para elas a ideia que teve:
- Você vai fazer um aborto! - Diz, olhando de forma decidida para a filha.
- Nunca! Nunca! Nunca! - Grita Simone, completamente fora de si.
- Mas você não tem escolha! Ou faz o aborto, ou vai embora! Aqui nesta casa, com um filho na barriga, não fica! - Responde Oscar, também fora de si. Tenta ficar calmo para poder conversar. - Conheço um cara bom nisso, é meu amigo, faz sigilosamente, já fez numas meninas, filhas de uns amigos que temos... Ninguém soube... É coisa rápida... Você quase nem vai sentir dor...
Simone nem pensa duas vezes. Vai até o quarto, pega a mochila da escola, coloca algumas peças de roupa e sai sem se despedir dos pais.
Elvira lembra que chamou a filha várias vezes. Em seguida passou a chorar. Fazia menção de ir atrás dela, porém era contida pelo marido, que a segurava pelo braço.
- Ela que vá! Não quero filha sem-vergonha nesta casa!
Simone, ao sair, ainda estava com o uniforme do colégio. Foi à rua e seu destino era ignorado pelos pais. Elvira recorda, que a viu afastar-se e ficou pensando onde ela poderia ir aquela hora, quase oito da noite. Eram apegadas demais, uma a outra, por isso a filha contou-lhe logo da gravidez quando teve certeza de que realmente estava grávida. Algum tempo depois, ante os olhares da mulher ressentida, Oscar, bastante perturbado, sai e isso a tranquilizou um pouco, por pensar na possibilidade dele voltar atrás na sua palavra e sair a procurar a filha, a fim de trazê-la de volta à casa, mesmo estando grávida. Ou quem sabe, se ela aceitasse a ideia do pai e concordasse em fazer o aborto...
Finalmente foi amanhecendo, sem notícia alguma do marido nem tampouco da filha. Elvira ficara acordada a noite toda, no sofá da sala, no desejo de que a vida deles retornasse ao normal e que sua família voltasse a se unir, como anteriormente, com risos, abraços e brincadeiras, que acabavam preenchendo a inércia em que se encontrava. Eram as lembranças de uma família feliz.
As horas passavam lentamente. Elvira só não perdeu a noção do tempo por estar com o relógio à sua frente. Não dormira a noite toda, sendo que pela manhã recebeu o único contato com o mundo exterior. Um telefonema que lhe comunicava a morte da filha. Desespero e dor, numa incontida tristeza se apoderou dela, fazendo-a chorar. Correu ao IML, no fundo do peito mantendo a esperança de não ser de sua filha o cadáver que foi encontrado. Porém, vendo o corpo, reconhecendo-o, teve a certeza de que realmente aquele era o corpo da Simone.
Elvira chora mais ainda quando relembra o início de sua vida conjugal com o Oscar. Moravam numa meia-água bem pequena, com um cômodo que servia de sala e quarto ao mesmo tempo. No começo da vida em comum do casal, a Simone dormia numa caminha ao lado da cama deles. Isso até aos seis anos de idade, mais ou menos, quando mudaram para uma casa maior e Simone ganhou um quartinho. Pois justamente no início, quando a vida era mais difícil e a situação a magoava muito, é que Elvira mais lamentava com o marido o fato de não poder ter outro filho. Eram lamentações que levavam muitas das horas que teriam de sono. Contrastando com essa realidade, demonstrava à filha que a felicidade daquele amor por ela era o suficiente. Será que ela sabia? Teria ouvido alguma coisa que falávamos enquanto ela dormia? Diversas vezes pensei haver uma ligação, algum indício, daquelas lamentações noturnas com o fato da Simone falar insistentemente comigo que queria ter um filho. Seria uma forma dela recompensar meu destino? O fato é que não consegui ter outro filho depois dela. Tanto que tentei, fiz tratamentos... Parece até que estava adivinhando que um dia perderia a única filha que pude ter.
Olhando a casa, Elvira constata que nada mais ali tem significado. Olha os cômodos, os móveis. Então pensa que nunca mais terá o sorriso da filha a dar-lhe o alento na existência. Nunca mais!
O telefone toca. A funerária comunica a Elvira que tudo deve ser preparado para o velório. Ela veste-se rapidamente. Trajando luto, prepara-se para velar o corpo da filha. Liga para Gisele, a melhor amiga de Simone, comunicando-lhe o que tinha acontecido. Gisele faz questão de ir também ao velório.
As duas combinam de se encontrarem na casa da Elvira, para irem juntas ao evento. Quando estão saindo, vêem da janela da sala o Oscar chegando.
Oscar chega à casa, embriagado. Entra, esbarrando nos móveis, derrubando tudo à sua frente. Elvira não consegue olhar para ele e nem o fato de vê-lo naquele estado, o que nunca tinha acontecido, consegue amenizar sua revolta. Fica calada, se omitindo de falar com ele, enquanto Oscar entra e vê a mulher e a visitante.
- Aonde você vai, mulher? Assim toda de preto, com essa garota aí? Vocês estão parecendo dois urubus!
Gisele tenta falar alguma coisa, ou seja, se apresentar para aquele homem bêbado.
- Meu nome é Gisele. Sou uma amiga da Simone. Como o senhor está?
- É? Onde está aquela vagabunda? Aquela cadela?...
Elvira puxa Gisele pelo braço. Elas vão saindo e Oscar continua falando...
- Filha? Filha presta pros outros se aproveitarem dela! Aquela maldita! Quer me envergonhar! De barriga, sem casar... Nesta casa não entra! Não fica aqui, mesmo!...
As duas saem, indo para o velório, deixando Oscar a falar sozinho.
Oscar e Elvira nem imaginavam o que ia acontecer com a filha...
Até que a tragédia caiu sobre aquela família.
